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Seca e migração no Nordeste

Além das causas da fome é importante refletir sobre as suas consequências. No Nordeste brasileiro a questão da pobreza, sendo a fome uma de suas vertentes mais dramáticas, é recorrente; e uma de suas consequências é a questão das migrações internas. Guillen faz uma análise muito interessante de uma perspectiva histórica sobre a vinculação da seca no Nordeste brasileiro com as migrações. A autora destaca que muitos estudos relacionados a este tema privilegiam o aspecto ambiental, “explicando a migração como um acontecimento trágico, circunstanciado no tempo e geograficamente determinado. Como se os migrantes fossem grandes vítimas, produtos de uma condição ambiental” (GUILLEN, 2001, p.1) Deste ponto de vista os migrantes deixam de ser o sujeito, transferindo para a seca esta posição.

A autora explica que a migração tem sempre um sentido ambíguo, pois pode ser vista como migração forçada pelas condições econômicas, sociais ou ambientais em que o indivíduo está inserido; ou como uma escolha contra a miséria e a pobreza que existem no sertão.

“O problema está no fato de que numa vasta produção discursiva, retirou-se do migrante a sua condição de sujeito, como se migrar não fosse uma escolha, como se ele não tivesse vontade própria. Migrar pode ser entendido como estratégia não só para minimizar as penúrias do cotidiano, mas também para buscar um lugar social onde se possa driblar a exclusão pretendida pelas elites brasileiras através de seus projetos modernizantes”. 

Guillen aponta que a construção predeterminada do tripé Nordeste/ seca/ migração no imaginário brasileiro acaba por restringir ou tornar homogênio os objetivos e as condições que levam à migração. Outra visão já bastante disseminada seria que a migração levaria a perda das raízes e identidade do povo nordestino, esta visão traz mais uma vez a ideia do migrante na condição de vítima, de um indivíduo passivo diante de um ato que é tido como fruto imposições históricas e estruturais. Entretanto, a autora tem uma visão diferenciada, de que migrar é escolher mudar a realidade de exclusão social em que o indivíduo passa fome e sede. É buscar um ambiente em que se sinta socialmente incluído e fugir da exploração e dominação que encontrava no local de origem.

A autora constata que a afirmação periódica de que "o problema da seca e das migrações no sertão nordestino é histórico" recorre a algo que acontece com freqüência há muito tempo e trata de um problema social que não tem solução.

“Histórico nesse caso tem o significado de permanência. É nesse sentido que a falta de solução para o problema da seca é histórico, os problemas políticos são históricos, ou seja, os políticos é que sempre saem lucrando com a seca, a ausência de políticas públicas e a falta de recursos do governo federal para solucionar os problemas do sertão são históricas... O histórico é de tal forma banalizado que acaba por transformar o semi-árido em uma região aparentemente sem história, dadas a permanência e a imutabilidade dos problemas.” 

Para finalizar, a autora discute que a história é entendida neste caso do ponto governamental, ou seja, das políticas públicas (que costumam ser semelhantes e usar os mesmos mecanismos) direcionadas a questão da seca, porém os sujeitos que convivem com estes problemas não se apresentam como atores estáticos, pelo contrário, são muito dinâmicos. Como podemos constatar pelas migrações internas, que representam a fuga da condição de fome e seca, e em um panorama mais geral, da pobreza.


Referência:

Guillen, Isabel Cristina Martins. “Seca e migração no nordeste: Reflexão sobre o processo de banalização de sua dimensão histórica”. Trabalhos para discussão. Vol. 111. 2001.

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