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  • Foto do escritorThiago Lima

Segundo agências da ONU, o Brasil continua passando fome

Por Ellen Maria Oliveira Chaves


O ano de 2020 se caracterizou como um período sem expectativas para a diminuição da fome no mundo. A esperança foi depositada nos anos seguintes para reduzir não só os impactos da crise da Covid-19, como também buscar alcançar o Segundo Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS): erradicar a fome. No entanto, segundo o relatório ''O Estado de Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo (SOFI)'', publicado pela Organização para Alimentação e Agricultura (FAO) em julho de 2022, o cenário só continuou a piorar. Cerca de 828 milhões de pessoas no mundo estiveram subnutridas em 2021, isso significou um aumento de 46 milhões nos dados divulgados em 2020, já em comparação com 2019, ou seja, antes da pandemia, o aumento foi de 150 milhões de pessoas que passaram a viver com fome. Situação que, segundo o relatório, diz respeito à desigualdade existente dentro e entre os países na recuperação econômica da crise pandêmica ainda em curso. O relatório ainda destaca, assim como em edições passadas, que os principais fatores causadores da fome a nível doméstico e internacional podem ser exemplificados em quatro pontos principais: conflitos, extremos climáticos, crises econômicas e desigualdades sociais. No relatório, a FAO, analisa a situação mundial da fome através de dois indicadores principais: Subnutrição (Undernourishment); e Insegurança alimentar moderada e grave. A instituição indica que o termo fome também pode ser utilizado como sinônimo de subnutrição, esclarecendo, é a dor física e sensação desconfortável que o corpo manifesta pela falta de alimentação adequada. A insegurança alimentar moderada acontece quando as pessoas possuem incerteza se vão conseguir comer nas próximas refeições, afetando a qualidade e quantidade dos alimentos que consomem. Já a insegurança alimentar grave ocorre quando a comida acaba completamente, e as pessoas podem passar até dias sem ingerir algum tipo de alimento. Em 2021, as regiões mais afetadas pela fome foram África, Ásia, América Latina e Caribe. A África é de maneira mais intensa afetada por esse flagelo. O relatório destaca que um a cada cinco africanos (20,1%) passaram fome em 2021, em comparação com 9,1% na Ásia, e 8,6% na América Latina e Caribe. O recorte de gênero também é destacado pelo relatório. São 31,9% das mulheres do mundo em comparação com 27,6% dos homens vivendo em contexto de subnutrição. Destaque maior para as regiões da América Latina e Caribe; e Ásia, com as piores porcentagens desse indicador. No Brasil a conjuntura encontrada é igualmente preocupante, visto que, entre 2014 e 2016, 1,9% da população vivia em insegurança alimentar grave, ou 3,9 milhões de pessoas, e entre 2019 a 2021, esse número cresceu para 15,4 milhões de pessoas, 7,3% da população brasileira. Já aqueles que enfrentaram algum grau de insegurança alimentar, seja moderada ou grave, esse número chega a ser aproximadamente 30% da população nacional, atingindo 61,3 milhões de brasileiros. De acordo com o SOFI 2022, esses registros encontram-se acima da média global, dado que a insegurança alimentar aflige cerca de um a cada três brasileiros, e analisando com as devidas proporções, a porcentagem a nível mundial chega a ser 28,1%. O SOFI adicionou pela primeira vez, em 2020, uma análise global sobre os custos e a acessibilidade de dietas saudáveis, acreditando ser um indicador indispensável para entender o comportamento das pessoas em relação à alimentação saudável. Assim, no final de 2020, em nível global, os preços dos alimentos ao consumidor atingiram um pico, alcançando o maior patamar dos últimos seis anos. Em 2020, 3,1 bilhões de pessoas não conseguiram pagar por uma alimentação saudável, um acréscimo de 112 milhões de pessoas em relação ao ano anterior. Situação causada pela velocidade de transmissão da Covid-19, que ao pressionar o sistema de saúde criou condição para várias medidas de isolamento e contenção do vírus. Impactando de forma assimétrica os países, houve forte pressão na cadeia de abastecimento alimentar, crise econômica e alta nos preços dos alimentos. Esse cenário foi responsável por aumentar os custos e a inflação dos alimentos ao consumidor, dificultando a acessibilidade de dietas saudáveis ao redor do mundo. O relatório conclui que em meio a todos esses ataques à segurança alimentar, à saúde, à situação econômica dos países e ao meio ambiente, torna-se imprescindível tornar acessível e mais saudáveis as dietas das pessoas ao redor do mundo. Além de necessitar analisar de forma cuidadosa as políticas existentes para a agricultura e alimentação. Entre 2013 e 2018, o apoio a esse setor foi, em média, de 630 bilhões de dólares anuais, sendo que 70% desse investimento foi dedicado a agricultores individuais, através de políticas comerciais, de mercado e subsídios fiscais. Segundo o SOFI, nos países de renda alta e média-alta, o apoio é focado principalmente em alimentos básicos, laticínios e outros alimentos ricos em proteínas, por exemplo, arroz, açúcar e carnes, enquanto os produtores de frutas, verduras e hortaliças são colocados de lado sem receber o mesmo incentivo para a produção. O apoio não atinge de forma igualitária todos os agricultores, destrói a natureza e não investe de forma adequada na produção de alimentos responsáveis por uma dieta saudável. Outro fator que pegou desprevenido as cadeias globais de alimentos, em 2022, foi a guerra na Ucrânia. Desregulando ainda mais as cadeias alimentares, a situação afetou os preços dos grãos, dos fertilizantes e da energia, principalmente petróleo e gás natural. Por fim, é com esse cenário de alta nos preços dos alimentos que nos deparamos com as mais variadas infelizes circunstâncias. No Brasil, a venda de ossos e peles de frango tomam destaque nas manchetes, mais pessoas estão na rua pedindo comida e um governo alheio a todos esses ataques aos seus cidadãos ocupa o Planalto. lhamos também ao passado para lembrar que há quase vinte anos era criado o programa Fome Zero que, composto por políticas como o programa Bolsa Família, foi responsável por tirar o Brasil do Mapa da Fome, em 2014. Entretanto, atualmente, no governo Bolsonaro, nos deparamos com a notícia que o Brasil volta a ser um país de famintos. Vamos continuar apáticos em meio a todos esses ataques? Ou o povo brasileiro vai a luta e responder na urna que merece comer comida de verdade, que não merece viver de ossos e peles que outrora seriam jogadas no lixo?

Publicado originalmente em Brasil de Fato PB


Ellen Maria Oliveira Chaves é graduanda em Relações Internacionais e integrante do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais da UFPB (fomeri.org)

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